No início de uma formação presencial escrevi no quadro “És um preguiçoso!” e pedi que levantassem a mão as pessoas que concordavam que aquela afirmação descrevia uma observação acerca de alguém. Das 26 presentes, apenas uma meia dúzia ficou na dúvida, sem saber se haveria de levantar a mão. Todas as outras estavam seguras de que aquela afirmação traduzia uma observação. Apesar do contexto social que se vive, de grande caos, com novelas e outros programas televisivos de grande intriga no topo das audiências, jogos de futebol onde as claques se insultam e agridem mutuamente, onde os políticos dizem mal uns dos outros em vez de cooperarem para o bem comum, fiquei algo surpreendido com aquela resposta. Como é tão fácil julgar alguém, confundir a pessoa com os seus atos, e isto não é uma escolha pessoal. Está no inconsciente coletivo, numa espécie de normalidade que se foi construindo lentamente e ficou a fazer parte do nós. Não tendo sido imposto, acabou por o ser, já que não tínhamos outras referências para além dos nossos pais, dos professores e da sociedade onde crescemos e vivemos. Estamos a mudar o mundo com o nosso trabalho individual, começando por aprender a observar, libertando-nos de todos os pensamentos e julgamentos.
A forma como observamos o mundo, a realidade à nossa volta e, mais importante, a forma como observamos aquilo que nos acontece, é uma projeção do nosso mundo interior. Importa, pois, ir desbravando este mundo, entrando em contacto com ele, e conhecê-lo melhor.
O primeiro passo para conquistar esse tesouro que é o poder da comunicação consiste em olhar a realidade objetiva, observar aquilo que nos aconteceu, que nos fizeram ou disseram, de uma forma exata, que possa ser registado num aparelho de medida, localizado no espaço e no tempo. Neste passo, precisamos de nos distanciar das avaliações e interpretações que fazemos sobre o que os outros nos fazem e fazer uma leitura imparcial dos acontecimentos. Referido isto, todos concordaram que os que haviam levantado o braço estavam a referir-se a um julgamento sobre alguma coisa que alguém tinha feito, e vieram então muitas ideias possíveis sobre observações.
Quando verbalizamos pensamentos e julgamentos sobre o outro, estamos a usar uma linguagem estática, que não promove qualquer mudança na pessoa ou na situação. Se uma mãe diz a um filho “és um desarrumado!” ele tenderá a adotar esse comportamento, porque ele acredita na mãe. Quando nos limitamos a referir observações, estamos a abrir o diálogo e, muitas vezes, a informar o outro de algo que ele nem sequer se tinha apercebido.
Em vez de dizeres: “Chegaste atrasado.”
Experimenta dizer (observação): “Chegaste dez minutos depois do início da aula.”
Em vez de dizeres: “Tiraste negativa no teste de matemática.”
Experimenta dizer (observação): “Tiraste nove no teste de matemática.”
Em vez de dizeres: “És um preguiçoso.”
Experimenta dizer (observação): “Levantaste-te ao meio-dia e agora estás a pedir-me para te fazer o pequeno-almoço.”
Em vez de dizeres: “O João ontem estava furioso.”
Experimenta dizer (observação): “O João ontem levantou a voz quando falou comigo.”
Em vez de dizeres: “O meu marido trabalha demais.”
Experimenta dizer (observação): “O meu marido chegou todos os dias a casa depois das oito horas, nas últimas 3 semanas.”
Em vez de dizeres: “O meu filho nunca escova os dentes.”
Experimenta dizer (observação): “Precisei de lembrar o meu filho para lavar os dentes nos últimos 3 dias.”
Em vez de dizeres: “A minha mãe reclama quando eu falo alto.”
Experimenta dizer (observação): “A minha mãe disse-me para eu me sentar em silencio, quando eu lhe falei alto ontem.”
Em vez de dizeres: “A Mariana é simpática.”
Experimenta dizer (observação):“A Mariana cumprimenta os colegas sempre que chega de manhã.”
UMA IDEIA IMPORTANTE
Se queres transformar um conflito, começa por te limitares a referir aquilo que o outro fez ou disse que te causou mal-estar, em vez de emitires pensamentos e julgamentos sobre ele.
UMA IDEIA AINDA MAIS IMPORTANTE
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